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Diagnóstico de pré-câncer é obtido no Cerumenograma

Pesquisa do matonense Nelson Antoniosi e equipe teve divulgação na BBC

Nelson Antoniosi. "Com a análise química da cera de ouvido, agora é possível diagnosticar o pré-câncer, o câncer e a remissão do câncer"
Foto: Rogério Bordignon

Em 2019, pesquisadores orientados pelo matonense Nelson Roberto Antoniosi Filho (professor doutor da Universidade Federal de Goiás - UFG) conseguiram demonstrar que é possível diagnosticar qualquer tipo de câncer, em qualquer estágio, via análise da composição química da cera de ouvido, usando uma técnica denominada ‘Cerumenograma’.

“Usando essa mesma técnica, em 2025, demonstramos em artigo publicado (https://doi.org/10.1038/s41598-025-97440-2) que as muitas doenças chamadas câncer apresentam um processo metabólico específico que se inicia com uma inflamação celular, levando a uma etapa de diferenciação celular chamada displasia, até chegar ao câncer, a neoplasia. Este processo é denominado de ‘Tumorogênese’, quando são geradas substâncias químicas diferentes daquelas produzidas por um indivíduo saudável”, diz o pesquisador matonense.

A equipe de Nelson descobriu que estas substâncias se concentram na cera de ouvido. “Com a análise química da cera de ouvido, agora é possível diagnosticar o pré-câncer, o câncer e a remissão do câncer. Diagnosticar o pré-câncer significa apontar, com meses ou anos de antecedência, que algo precisa ser feito para evitar que o câncer venha a surgir”, comenta.

O professor doutor afirma também ser possível acompanhar o tratamento daqueles que apresentem câncer, podendo determinar em qual momento estão curados, sem que os pacientes tenham que passar pelo desgaste psicológico de esperar alta médica após cinco anos de acompanhamento, tal como é o período convencional adotado pela oncologia para a remissão dessa doença.

Sobre o que Nelson considera ser “a ciência feita pelas instituições públicas brasileiras à serviço da vida”, A Comarca atualiza o tema ‘Cerumenograma’. Como novidade, há a informação quanto ao diagnóstico do pré-câncer, do câncer e da remissão do câncer. Segue a entrevista com Nelson, que também é o responsável pela instalação do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP) em Matão.

 

Qual o histórico do ‘Cerumenograma’?

Em 2014, fui procurado pela pesquisadora egípcia Engy Shokry, que realizou o seu estágio de Pós Doutorado na UFG, sob minha supervisão. Como ela era uma pesquisadora especializada em diagnósticos de doenças usando o plasma sanguíneo, propus a ela o desenvolvimento de diagnósticos clínicos via análise química da cera de ouvido. De abril de 2015 a setembro de 2017, Engy desenvolveu sete trabalhos científicos enfocando diagnósticos de intoxicações por medicamentos e uso de drogas de abuso, bem como o diagnóstico de doenças como o Diabetes Mellitus, todos via análise da composição química da cera de ouvido. Nesta última situação foi possível distinguir indivíduos saudáveis de portadores do Diabetes Tipos 1 e 2, simplesmente analisando a negligenciada cera de ouvido. Passo adiante, vislumbrei a possibilidade de se diagnosticar câncer em animais e humanos, já que isso normalmente envolve técnicas caras e complexas, as quais conseguem detectar cânceres somente em estágios mais avançados do que aqueles em que se poderia obter curas mais simples, rápidas, menos traumáticas e de menores custos. Nessa etapa, Engy obteve 100% de precisão no diagnóstico de câncer em cachorros, com baixo custo, rápida execução e sem ser invasiva. Ao concluir este trabalho, ela se mudou para Munique (Alemanha), acompanhando seu cônjuge Jair Gonzalez Marques Júnior, que foi aluno de Iniciação Científica e de Mestrado sob minha orientação. Na sequência, o então mestrando João Marcos Gonçalves Barbosa – atualmente doutor em Química pela UFG – demonstrou que também em humanos é possível diagnosticar com máxima certeza qualquer tipo de câncer, em qualquer estágio de desenvolvimento, usando somente a análise química da cera de ouvido, o denominado ‘Cerumenograma’. Então, desde 2019, a humanidade conhece uma forma simples, barata, segura, indolor e de alta confiabilidade para diagnosticar o câncer em estágios iniciais. O estudo contou também com a participação de médicos otorrinolaringologistas do Hospital das Clínicas da UFG, que, sob a coordenação da professora doutora Melissa Ameloti Gomes Avelino, efetuaram a coleta das amostras de cerúmen de voluntários sadios e de portadores de câncer, analisadas por nossa equipe. O ‘Cerumenograma’ permite o aumento dos índices de cura com a consequente diminuição da mortalidade humana. Além disso, os sistemas de saúde podem dispender menos recursos financeiros para o tratamento de doentes e o sofrimento dos pacientes e familiares diminuirá. O trabalho foi aceito para publicação na ‘Scientific Reports’, da renomada revista ‘Nature’, podendo ser acessado por este link: https://doi.org/10.1038/s41598-019-48121-4. Aconselho que todas as pessoas se submetam ao exame de ‘Cerumenograma’ ao menos uma vez ao ano e que as pessoas com predisposição genética ou suspeita de serem portadoras de cânceres o façam com maior frequência.

 

O quanto avançou o ‘Cerumenograma’ desde 2019?

No último dia 22 de abril foi publicado, na mesma revista ‘Scientific Reports’, o artigo científico que retrata o progresso efetuado após 2019. Nesse período, minha equipe observou que alguns voluntários que declaravam não apresentar diagnóstico de câncer geraram resultados positivos no ‘Cerumenograma’, indicando que algo estaria errado com relação à saúde do voluntário. Ao aprofundar-se na realização de exames de imagens, feitos no Instituto de Medicina Nuclear (Imen) e no Instituto do Aparelho Digestivo (IAD), ambos em Goiânia (GO), observou-se que tais voluntários se encontravam nos estágios denominados pré-câncer – inflamação hipermetabólica celular e/ou displasia – ou até mesmo possuíam neoplasias. Isso me fez compreender que o processo bioquímico que ocorre no câncer já acontece nas etapas anteriores a ele. Naquele momento, iniciamos uma parceria com o Hospital ‘Amaral Carvalho’, em Jaú (SP), a qual foi firmada por intermédio de um voluntário do projeto que, segundo seu oncologista, não apresentava câncer em outubro de 2019, mas para o qual obteve-se resultado positivo no ‘Cerumenograma’, constatado por exame de imagem que atestou um pequeno linfonodo de somente 0,7 centímetro. O paciente obteve sucesso com o tratamento, acompanhado também pelo ‘Cerumenograma’, o qual indicou aos médicos o momento em que a remissão do câncer ocorreu, em maio de 2023, também confirmado por exame de imagem. Além disso, avaliando outros voluntários, verificamos que o ‘Cerumenograma’ apresenta resultados negativos para cistos, metaplasias e tumores benignos, o que é útil na diferenciação destes com relação aos tumores malignos.

 

Como se encontra a parceria com o Hospital ‘Amaral Carvalho’?

Atualmente, auxiliamos este hospital no diagnóstico e no acompanhamento da remissão do câncer em pacientes que lá se encontram sob tratamento. Além disso, o ‘Amaral Carvalho’ disponibilizou uma enfermeira que efetua a coleta de amostras de voluntários sadios ou oncológicos de forma a ajudar na ampliação do número de amostras avaliadas via ‘Cerumenograma’, o que permitirá uma maior compreensão dos processos bioquímicos que ocorrem na ‘Tumorogênese’.

 

O que outros países sabem a respeito deste exame?

A publicação em artigos científicos, por si, já divulga bastante o trabalho. O primeiro artigo, por exemplo, foi acessado por mais de 23 mil pesquisadores de todo o planeta, tendo sido o 75º mais acessado entre aproximadamente 20 mil artigos publicados em 2019 pela revista ‘Scientific Reports’. No último dia 28, uma extensa matéria foi publicada no site da britânica BBC, destacando os avanços realizados em nossa pesquisa, o que difundirá ainda mais o exame que desenvolvemos. A matéria na BBC pode ser acessada pelo link https://www.bbc.com/future/article/20250424-what-your-earwax-can-reveal-about-your-health.

 

Por que não há a dissipação do ‘Cerumenograma’ para a população através da rede pública de saúde?

Para que o exame seja disponibilizado à população, uma vez concluídos os estudos que publicamos, torna-se necessário impetrar processos junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), à Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) e no Ministério da Saúde, visando avaliação, aprovação e adoção do ‘Cerumenograma’ como um diagnóstico disponível à população. Isso normalmente demora meses ou anos. Também é importante saber que isso dependerá do investimento na ordem de milhões de reais para a instalação de infraestrutura, treinamento de pessoal e dissipação da técnica para outros lugares do país. No entanto, tal investimento poderá trazer bilhões de reais em economia ao Brasil.

 

A perspectiva é pela aprovação?

Sim, já que estamos seguindo todos os trâmites exigidos e com resultados que são muito superiores aos diagnósticos anteriormente aprovados e adotados em oncologia.

 

Se aprovado, qual o futuro do ‘Cerumenograma’?

O exame caminha para ser tão convencional quanto um hemograma. A expectativa é de que o exame seja gratuito na rede pública, sendo efetuado por instituições públicas de ensino e pesquisa que possuam cursos de Química e/ou Farmácia. Em Matão, por exemplo, há equipamentos necessários e infraestrutura adequada para se realizar exames no IFSP-Matão.

 

Você teme lobbies contrários por diferentes setores?

O advento de novas tecnologias – incluindo ferramentas de análises química e computacional – está mudando a medicina, bem como outras áreas. Este é um processo irreversível e os profissionais destas áreas terão que se adaptar para contemplar processos e produtos de menores custos e maiores eficácias. Tudo o que desenvolvemos já foi publicado, o que significa que é de domínio público, não havendo como barrar a utilização desta tecnologia. Isso foi feito exatamente para garantir que tal diagnóstico chegasse à população. Em 2019, quando divulgamos o ‘Cerumenograma’, recebi uma proposta de um fundo de investimentos que queria, a qualquer preço, obter os direitos de uso exclusivo da técnica, algo que prontamente neguei, pois o objetivo é de que a ciência desenvolvida com recursos do imposto do contribuinte retorne ao pagador. É assim que se retribui o investimento feito em educação, ciência e tecnologia.

 

Quais são os benefícios do exame?

O ‘Cerumenograma’ proporcionará qualidade de vida e grande economia ao Brasil e demais países, os quais gastam quantias vultosas com o tratamento de câncer. Isso mostra que financiar pesquisas é investimento; e não, gasto. Espero que a popularização do exame possa também ajudar no estímulo à realização de investimentos em educação, ciência e tecnologia no país.

 

Pessoalmente, você aguarda que a consequência deste desenvolvimento científico tenha reconhecimento mundial através de algum prêmio?

Espero que o ‘Cerumenograma’ possa alavancar o reconhecimento da qualidade do pesquisador brasileiro e que qualquer reconhecimento mundial que venha ocorrer estimule a juventude a se interessar por ciência e tecnologia, bem como que a sociedade reconheça a importância de professores e pesquisadores no desenvolvimento humano.


Fonte: Rogério Bordignon


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